terça-feira, 9 de agosto de 2011

Escolha saltar com os dois pés na água!


Retomando em retrospectiva

Hoje fez muito frio. Meu corpo tremeu. Vejo meus pés se moverem, as pernas mais firmes. Tenho uma sensação indescritível e muita vontade de chorar de alegria. Subo para o banho quente e coberta. Como eu queria que meus parceiros aqui tivessem a mesma evolução que tenho vivido. Por que as preces alheias não funcionam para todo mundo? Será que é porque aguento sofrer menos que eles? Visualizo fora daqui meus projetos, planos, vida. Preciso retomar o rumo. Mas as coisas têm outro sentido, outro gosto, outro valor. Começo a não me reconhecer mais no timbre das horas. Quando eu voltar pra casa não sei que língua vou falar porque tudo tem outro significado. Conheci pessoas que me mudaram para sempre. Nossas vidas bifurcaram as linhas de trem para o mesmo lugar e acabamos partilhando o mesmo vagão, na mesma viagem. Cada um com uma história guardada na mochila. Meus olhos deslizam em volta, contornam a penumbra, afagando de longe meus cúmplices. As vozes me invadem, me buscam lá no fundo.

"Perdi minha mãe e irmã e fiquei paraplégica em um acidente de carro na volta do enterro de minha avó"...

"Eu estava grávida de 7 meses...bati o carro, esperei 15 dias para o parto e só então fiz a cirurgia da coluna porque era a única chance da minha filha sair com vida...e saiu"...

"Na hora que caí do cavalo eu sentia tudo...meus braços, pernas, mas muita dor. Aí os caras vieram correndo e me colocaram em pé...depois disso não senti mais nada, mas não desmaiei"...

"Um cara me trancou, não gostei, desci do carro e discuti...voltei pra o carro e segui estrada. Lá na frente, ele me cercou e atirou no meu pescoço...ele já está solto e eu preso aqui, sem me mover"...

"Minha moto derrapou e eu entrei na parede...eu nem ia sair de casa"...

"Eu caí em uma cachoeira, estava acostumado, mas escorreguei"...

"Eu estava dormindo no banco de trás na hora do acidente, fui jogado, não tive como me defender da pancada"...

"Eu mergulhei e bati com o queixo com toda força no chão"...

“Eu estava no banco de trás. Era o único com cinto de segurança. Um carro veio pela lateral, todo mundo foi arremessado para o lado, menos eu. Ninguém teve nada grave, mas eu fiquei paraplégico”.

Tantos, muitos, outros. A enfermaria silenciava. Tudo calado nesse mundo de imagens e eu aqui, tentando editar o trecho que mudou a vida de cada um. Será que tudo isso é aleatório? Então nem adianta prevenir com atitudes sensatas? De fato, algumas coisas nos escapam mesmo quando somos cuidadosos e então a gente se consola com o clássico generalista: "era porque tinha de ser". Mas estatisticamente a prevenção dá melhores resultados. Penso em tudo que poderia ser evitado: bebida, celular, velocidade, sono e falta do cinto de segurança no volante. Confesso que me sinto uma idiota falando sobre isso porque eu sei que não vou atingir nada nem ninguém. Afinal, por que razão meu desabafo surtiria algum resultado mágico? A comunicação em massa, muito mais incisiva como suas campanhas publicitárias, repetitivas, comoventes, brutais e algumas vezes até apelativas para ver se consegue chocar ou arrancar algum efeito positivo na imprudência humana... ainda assim são infrutuosas! Imagina esse roteiro aqui, banal e saturado. Mas sou eu que estou aqui dentro escrevendo e você aí do outro lado me lendo. Estou em condição de dizer pelo menos algo com propriedade, não acha?

Não tenho a menor pretensão de mudar o mundo com essa postagem, afinal eu sou lúcida o suficiente para não formular metas tão inatingíveis assim. Mas não posso calar a urgência e meu propósito é simples: dar a você uma razão para construir atitudes que reduzam a possibilidade de alguma fatalidade que limite sua condição física. Verdade, você não tem poderes para controlar a manga que cai na cabeça, a bala perdida no seu pescoço, a tartaruga no meio de seu mergulho, a cabeça no teto do carro depois do quebra-molas inesperado, a arquibancada escorregadia, o vírus contraído no sushi ou na lagoa.

Mas pode, por exemplo, começar a obedecer às leis de trânsito, pelo menos as que preservam a vida, porque seu dinheiro não vai pagar a "multa" se o dano for em você ou em outra vítima! Pode também escolher não mergulhar de cabeça em nenhum lugar a não ser que esteja em uma competição de natação ou trampolim! Salte com os dois pés na água, é mais seguro! Faça você uma campanha com essa informação! Não precisa gritar no facebook. Fale com dois amigos, olhando no olho. Peça pra eles falarem para dois amigos. Mergulho é a segunda causa de lesão medular! Por que não vejo isso na televisão!!!? É simples, é uma frase! E evite brincadeiras na borda da piscina, não estrague justamente a festa de ninguém. Quando encontrarem alguém machucado em um acidente, chame o socorro imediatamente, e não se aventure a tocar a pessoa se não conhecer a técnica de resgate. Mesmo que a intenção seja das melhores, você pode provocar a lesão justamente quando manipula a posição da pessoa, ou durante o deslocamento, transporte ou coisa do gênero. E o pior, se só você fizer tudo certinho, ainda corre o risco de se confrontar com alguém que não leu nada disso ou até lê sobre o tema e assiste reportagens na televisão, mas no dia seguinte está de volta as estradas pensando no atraso, no compromisso ou tendo a certeza de que quando bebe torna-se ainda mais atento. Ou que tudo isso é besteira e não há de acontecer nada porque se acha o super-homem (e mal sabe como ele morreu!!). e se você ousar repassar a mensagem para alguém assim, ele pode dizer que é sensacionalismo apelativo. Engraçado... tenho que rir da tristeza, da ironia, do desolamento. Aqui estou rodeada de vida real, de pessoas que moram na esperança da ciência, na demora do nem se, nem quando. Sentados nessas cadeiras, os corações batem, a rotina segue, a vida continua. Retoma-se o prumo todos os dias, fazendo o que se pode com o que se tem. O resto, é sem escolha. Se você ainda tem sua chance de escolher, agarre-a, preserve-a e proteja sua vida. Se não tem mais essa chance de modificar a eventualidade, o dano definitivo ou temporário causado pelo "aleatório", faça algo para impedir que outros conheçam o que conhecemos. Estamos em 2011. Não sei se daqui a 5 ou 10 anos teremos contribuído para evitar que mais alguém se machuque. Na dúvida, alerte: Escolha saltar com os dois pés na água!

6 comentários:

  1. Sensação de alívio e de dor ao ler esse texto... Precisa eu lembrar que você sempre muda algo na minha vida???rs... Acredito que poucas pessoas irão ler, mas cabe a quem leu propagar e tentar fazer um mundo melhor. Estou muito feliz e orgulhosa de ti, apesar de sempre ter tido a certeza que reverteria o quadro. Aguardo anciosa a oportunidade de encontrá-la e também de ler seus textos atualizados sobre o retorno ao seu lar. Sinta-se beijada minha Dra. preferida. Amo vc.

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  2. Informação que merece mídia!

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  3. sim sim, adianta sim quando acontece com alguém ao lado!
    por exemplo, eu ficava injuriada com quem tomava a vaga prferencial. hj em dia eu fico completamente transtornada, a ponto de ir lá e falar com o pseudodeficiente (ou deficiente em cidadania).
    sim sim, hj desco as escadas com mais cuidado e não saltitando como antes. no transito, sempre cuidado, e cada vez mais.
    acho que algumas pessoas mereciam um "estágio" lá onde vc ficou. só de observação mesmo.

    feliz com sua volta, seu lugar é aqui, esse foi um tempo talvez necessário, mas não é seu nem é seu aquele lugar. porque vc merece outra situação, outa vida. e por merecer, vc teve. parabéns!

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  4. Seu Blog é simplesmente fascinante!
    É incrível como uma pessoa consegue transformar a dor em algo tão profundo e positivo para as outras.
    Abraços...

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  5. "Danyi"...não consegui reconhecer você pela foto. O jeito é vasculhar seu blog pra saber onde nos cruzamos. Que bom que gostou e que bom que ele trouxe algo de bom pra você. Abraço!

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